quarta-feira, 5 de março de 2008

Padrão dos descobrimentos, um comentário

Os sécs. XIV, XV e XVI foram, indubitavelmente, aqueles nos quais há um maior saudosismo para os portugueses. Não seria diferente, pois nesta "época de ouro", os portugueses - incentivados pelo grande dom João, rei de Portugal à epoca - lançaram-se ao mar. Através da bravura e espírito renovador buscaram novos caminhos, novas rotas comerciais, novos horizontes... Há também uma grande mágoa a respeito do terremoto que destruiu Lisboa e que demandou praticamente uma nova cidade... se não houvesse o terremoto talvez fôssemos ainda os maiores do mundo...
A impressão que fica - mesmo lidando com aqueles mais "esclarecidos" - é que o genocídio, a invasão e negação cultural, a colonização, a matança coletiva, o ódio disseminado, enfim, todas as consequências nefastas desse processo de "descobrimentos" é tida, ainda hoje, como algo normal ou acrítico.
É curioso ver como as caravelas antigas e os grandes nomes da navegação são simbólicos no País. Temos monumentos, ruas, galerias, estações de metrô, etc. quase que suplicando a volta de um tempo que não existe mais, em que Portugal era a grande potência do mundo graças às grandes navegações e a exploração de suas colônias.
Há mérito, p. ex., em descobrir uma nova rota comercial para as Índias, como fez Vasco da Gama? Talvez, mas daí a colocar no mesmo buraco a novidade das rotas comerciais ultra-marinhas (que no mais garantiu as bases objetivas para o Capitalismo que viria a consolidar-se 100 anos depois) e todo o processo de negação cultural, conquistas sangrentas, escravização (note-se aqui que o termo comumente usado é escravidão, como se fosse algo inato, e não como processo exterior ao indíviduo) e genocídio, no qual tanto nós - brasileiros - quanto outras nações (falo nação não como Estado, na acepção moderna, mas como território com sentimento de coletividade devido à Cultura, tradições, etc.) na África, fomos submetidos.
A beleza do monumento encanta, é verdade. A rosa dos ventos entregue de presente por alguma nação africana (não me lembro qual agora) cravada no chão com várias datas (das respectivas rotas), também encanta. O pôr-do-sol, presente às margens do Tejo, é algo fantástico de se ver.

MAS, para um revolucionário heterodoxo, companheiro de esquerda, foi demais... Que o monumento, feito em homenagem aos 400 anos dos "descobrimentos" na década de 60, possa permanecer intacto pelo seu valor artístico e histórico. Mas que as significações, orientações políticas e ideológicas, opções daqueles que estão fazendo o mundo de hoje - e cá estamos nós unidos para transformar o mundo material e o mundo simbólico construído para manter esse mundo material, num processo dialético -, possam demolir a idéia de descobrimento, para que a partir daí um diálogo mais sincero se estabeleça entre os países de língua(s) portuguesa(s).

saudações fraternalmente revolucionárias.

Um comentário:

Eduardo disse...

O meu maior medo ou espanto é que a gente do outro lado do atlântico tenha tanta certeza e visão diante do óbvio, um dia desses escutei um cara falando, não lembro quem, que disse mais ou menos isso: A questão central na história do "encantamento" do Brasil, é que aprendemos a ser tão cínicos com a nossa história como os portugueses, então varremos para baixo do tapete os genocídios, escravidão, opressão...Em nome de uma cordialidade com quem nos colonizou ou quem ainda nos coloniza. Afinal de contas e se nós fossemos eles, seria muito provável que seríamos iguais".Algo por aí, não recordo ao certo, acho que ainda seríamos piores, porque essas últimas semanas a quantidade de "festa" na mídia pelo 200 anos de vinda da coroa portuguesa,estão forjando a criação de um estadista formado no Brasil Dom Pedro I(mulherengo, esperto...), a genialidade de João(estratégico, enérgico), a bondade de Isabel(libertou os negros por princípios humanistas), fica parecendo que tivemos foi muita sorte em ter a companhia deles durante tantos anos. Aquele Abraço...Falou aê. Traga pelo menos um pastelzinho de Belém...Isso eu não vou negar que foi um bom legado.